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Projeto Taiboco

Depois de uma ceia bem simples a conversa esticou-se um pouco e as crianças, muito cansadas, estavam quase a dormir. Perguntei ao Juliano porque é que elas não queriam ir dormir e ele respondeu que, na casa deles, tinham estabelecido um hábito, que depois de acabada a ceia ninguém podia levantar-se da mesa antes que ele fizesse uma oração de agradecimento a Deus pelo Seu cuidado ao longo do dia, pelos alimentos e pela Sua providência para com eles! Foi algo que nos impressionou muito mesmo! Estive a meditar para comigo; quantas vezes, no mundo desenvolvido, a grande maioria das famílias abastadas, apesar de tantas bênçãos recebidas, nem sequer diz um simples obrigado ao seu Doador!

Acabada a oração, as crianças recolheram-se instantaneamente nos seus aposentos.

Os pais do Juliano demonstraram uma certa preocupação e perguntaram-nos onde estávamos a pensar dormir; se no carro ou se tínhamos trazido alguma tenda. Eu respondi que a nossa ideia era dormir na casa deles, caso tivessem algum cantinho para nós. Entendemos logo que o problema não era o espaço, mas sim um certo acanhamento em nos convidarem a dormir numas condições mais “modestas”, mas depois de lhes assegurar que nos acostumávamos facilmente a qualquer situação, Juliano mostrou-nos a nossa “suite real”, onde por quatro noites tivemos o privilégio de sermos hospedados…

Depois de instalada a nossa cama, deitámo-nos bem cedo, cerca das 21 h, mas o sono tardava em aparecer, pois cada vez que troco a minha caminha tenho uma certa dificuldade em adaptar-me a outra, mas desta vez, mais ainda, estava saboreando uma experiência totalmente diferente, pois o colchão era mesmo “especial”!

No silêncio e na escuridão da noite ouvia-se  uma autêntica orquestra de grilos a cantarem e para completar ainda a nossa admiração ficámos literalmente extasiados com a dança de umas dezenas de pirilampos que pareciam estar perfeitamente sincronizados com o cântico deles! Foi mesmo engraçada a nossa reação ao vermos aquelas pequenas luzinhas a acenderem e logo, quase de imediato, a apagarem-se! Interrogámo-nos, intrigados, qual seria a causa disso e finalmente a minha memória deu-me um flash com momentos da minha infância quando, em certas noites do ano, corria extasiado, juntamente com outras crianças, atrás de centenas de pirilampos e depois de os apanhar tirávamos-lhes as  “lanternas” e colávamo-las na testa com saliva, para que depois pudéssemos assustar outras crianças e até os adultos, na escuridão da noite…

Realizámos que se a casa do Juliano tivesse teto talvez não seríamos beneficiados deste lindo espetáculo, pois a mesma só tinha telhado em chapa que permitia facilmente a entrada e a saída dos bichinhos.

Por um bom bocado de tempo desfrutámos destes momentos singulares, pois nas noites seguintes não tivemos mais este privilégio, embora estivéssemos tão ansiosos para chegar a noite…

Mesmo depois do Radu ter começado a dar os primeiros roncos, ainda estava extasiado com todo aquele ambiente rodeado de um ar surreal e místico! Finalmente, o cansaço venceu e deixei-me dormir.

Os timorenses, no geral, são bem madrugadores e nós, como é obvio, alinhámos sem muito entusiasmo inicialmente, contudo muito motivados para começarmos a implementar a nossa façanha. Depois do mata bicho (pequeno almoço) apresentámos o nosso plano ao Juliano e respetiva família, que ficaram muito gratos e encantados com a ideia.

Neste primeiro dia, começámos por arranjar os cocos que o Juliano havia cortado de alguns coqueiros que tinha, mesmo, no seu quintal.

A parte mais engraçada foi quando lhes tirámos a casca, pois tanto eu como o Radu tentámos imitar o Juliano, contudo sem muito êxito… Quando veio a minha vez, depois de algumas tentativas falhadas, o Radu disse-me para observar a rapidez e a facilidade do Juliano com qual estava a trabalhar e argumentei que era devido à qualidade da catana que ele usava, pois considerava que a minha não cortava tão bem. O Juliano começou a sorrir, estendeu-me a sua catana e eu entreguei-lhe a minha, mas mesmo assim para o meu “desespero” a famosa catana continuava a cortar “mal”!!! Fartámo-nos de rir!

Depois de tirada a noz de coco ensinámos-lhes como ralá-la na nossa maquineta e, tanto o Juliano, como a sua esposa e irmã, experimentaram, cada um de sua vez, como deviam fazer este trabalho.

Acabada esta tarefa misturámos bem, o coco ralado, o açúcar a gosto, um punhado de farinha e uma chávena de água, até tudo ficar homogeneizado para se poderem fazer os bolinhos. Depois de moldar umas bolas, colocámo-las numa forma revestida com papel vegetal e foram ao forno até dourar.

Bem pode aproveitar a dica e experimente-a: vale bem o esforço, pois, quanto a mim, são mesmo deliciosos estes bolinhos!

Ensinámos-lhes, também, a fazerem pão que tanto dava para vender como para o próprio consumo da família.

Poucos minutos depois do forno começar a aquecer, os bolinhos e o pão começaram a libertar um cheirinho muito agradável… devia ver a carinha dos miúdos e a do próprio Juliano no momento que tirámos a primeira forma, com os bolinhos e o pão prontos para serem… apreciados!

Assámos, também, amendoins e batata doce que foram, da mesma maneira, muito apreciados e saboreados durante a nossa ceia, pois nunca nenhum membro da família tinha tido a oportunidade de provar, até à data, batata doce assada!

Acabada a ceia, tivemos o nosso momento habitual de gratidão para com nosso Pai celestial, agradecendo-Lhe o Seu cuidado paternal para connosco, naquele dia, através da oração do sacerdote da família: o Juliano.

A seguir, o Radu montou uma rede e convidou o Juliano a experimentá-la. Ele adorou balançar-se, na mesma, juntamente com o Radu e quando soube que ele queria oferecer-lha parecia uma criança que acabou de receber o seu brinquedo preferido!!! Basta olhar para a cara dele, pois diz tudo!

Através destas pessoas, com um viver tão simples e despretensioso, uma vez mais, Deus nos quis transmitir uma grande e importante lição de vida: é preciso tão pouco para sermos felizes!

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