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Brinquedos originais…made in Timor!

Recordo-me com muita nostalgia da minha infância ao observar as brincadeiras das crianças timorenses e os seus brinquedos.

As famílias, em Timor-Leste, são numerosas e os filhos mais velhos começam a sentir, bem cedinho, o duro da vida, o peso da responsabilidade ao contribuírem nos trabalhos domésticos.

Apesar das tarefas diárias que lhe são atribuídas (cuidar dos animais, limpar os espaços onde dormem, lavar a loiça, apanhar lenha, cozinharem…), nenhum momento  é desperdiçado.

Tantas vezes, bem de manhã, cruzo-me com crianças (umas mais crescidinhas, outras nem por isso), a carregarem bidons com água, feixes com lenha (fazendo um pequeno parenteses, a comida, aqui, é feita maioritariamente com lenha…como a grande parte dos timorenses são pobres e não têm possibilidade de comprar fogão a gás e mesmo se tivessem recursos não querem, sequer, ouvir falar em cozinhar com gás, pois aconteceram no passado alguns acidentes com algumas botijas com gás, devido ao mau uso, e por isto nem sequer os mais abastados venceram este medo, continuando a usar, ainda, fogões a petróleo, à ” la antiga…”), alguns vendem,  porta a porta, hortaliças, frutas, carne, peixe, etc.

Cada manhã, quase sempre, acordamos com o som, bem estridente, de duas crianças, de pés descalços, magras e queimadas pelo sol, que anunciam a venda dos seus bolos, tofu frito, tempe, etc.

Certa vez, um amigo timorense contou-me algo sobre a sua infância tão conturbada. Devido às dificuldades que os seus pais tinham para assegurar a comida necessária, de cada dia, para eles e para os seus quatro filhos, ele, vendo que os mesmos mal conseguiam dar conta do recado, para lhes aliviar o fardo, decidiu, com os seus 9 anos, sair de casa para viver com uns tios, que concordaram dar-lhe um lugar para dormir e alimento, em troca do seu trabalho para os ajudar nas suas tarefas domésticas.

Impressionou-me, mesmo muito, quando me disse que, o seu dia começava às 4 horas de madrugada com a primeira tarefa ao empurrar, por alguns quilómetros, um carinho cheio de bidons em plástico para trazer a tão essencial água para as necessidades caseiras. Por volta das 6 horas, quando os seus tios costumavam levantar-se, o tanque de água deveria estar cheio e, logo de seguida, quase que sem nenhum tempo para recobrar o seu fôlego, devia ir cortar uma grande quantidade de ramos, de umas árvores bem altas, para servirem de alimento às vacas e as cabras, dos seus tios. Uma hora mais tarde, como de costume, comia apressadamente o seu pratinho de arroz e, de imediato, deveria trocar de roupa, vestir a sua farda, pegar na sua mochilinha e pôr-se a caminho da escola, cerca de uns bons quilómetros e como é obvio; a pé! Talvez julgue que estes tristes acontecimentos são realidades que remontam para um passado bem longe, dos avós ou  dos bisavós, mas surpreendentemente isso aconteceu apenas há 15 anos atrás!

Como esta história há muitas outras… de crianças que se veem, regularmente na rua, a cuidar dos seus irmãozinhos e até a carregá-los no colo e nas costas, com muito esforço, mas com muito carinho e dedicação…algo realmente extraordinário e comovedor!

 Divirto-me, de verdade, a ver os netos mais velhos do meu senhorio que, antes de varrerem o espaço ao redor da casa e apanharem as folhas secas para um carro de mão, carregam com os irmãos mais pequeninos dentro dele e brincam tempo sem fim, soltando inocentes gargalhas contagiantes …

Não têm dezenas de brinquedos, como as crianças do ocidente, pois os pais não têm dinheiro para os adquirirem, contudo se pode observar facilmente nas suas faces a alegria de usufruírem do seu único brinquedo, comparativamente às que têm “montes” deles e se aborrecem, de cada novo brinquedo recebido, poucos dias depois…

Esta realidade, ajuda-os a desenvolver a sua criatividade, pois constroem os seus brinquedos com garrafas de plástico, latas, pneus de motas usados, rodas de bicicleta… enfim, autênticos artistas!

Eis alguns exemplares:

Sabemos que chegará o dia em que teremos de despedir-nos de Timor, mas, seguramente, levaremos connosco, no coração, um pedaço deste pequeno mundo, lembrando com nostalgia os bons momentos que passámos aqui e especialmente o sorriso inocente e singular destas maravilhosas crianças…

Não há dúvida que: “O melhor do mundo são as crianças”, tal como afirmou Fernando Pessoa.

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